ÁGUAS DE MARÇO

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Em celebração aos 473 anos de Fundação da cidade do Salvador, apresentamos a exposição “Água de Março”. A exposição resgata a memória e a importância das primeiras fontes de água natural de Salvador e o surgimento da primeira companhia de abastecimento de água do Brasil na Bahia.

Desde origem da fundação da cidade de Salvador, o território que é banhado pelas águas salgadas do oceano atlântico e pelas águas calmas de kirimurê (grande mar interior que em 01 de novembro de 1501 em homenagem ao dia de Todos-os-Santos “Kirimurê” foi rebatizada “Baía de Todos-os-Santos” pelos navegadores portugueses) e abastecido de vários leitos de água doce que cortava toda a extensão de terra que antes da chegada dos colonizadores europeus era habitada pelo povo tupinambá.

Em uma pequena enseada do território tupinambá, em 1536 foi fundada a como “Arraial do Pereira” pelo primeiro donatário da Bahia Francisco Pereira Coutinho, local hoje conhecido pelos baianos e turistas de “Porto da Barra.”   

Uma das nascentes de água doce utilizada pelos tupinambás e pelos habitantes da vila do Pereira, localizada nos arredores que hoje é o bairro da Graça, deu origem a “Fonte Nossa Senhora da Graça” e conta à lenda que a índia Paraguaçu (mar grande) costumava se banhar nas águas doces desta nascente.

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Em março de 1549 com a chegada da esquadra naval de Tomé de Souza na prainha da enseada da Vila do Pereira, atual Porto da Barra, com a finalidade de encontrar um sítio sábio seguro e com abundância de água doce para dar início a implantação da nova cidade/sede do Governo-Geral do Brasil.

Com a contribuição e participação dos índios tupinambás e de Diogo Álvares, o Caramuru, Tomé de Souza conheceu “o mais conveniente lugar que há nas ditas terras do Brasil” a praia calma e tranquila das águas da Baía de Todos-os-Santos local ideal para as amarrações das embarcações e as nascentes de olhos d´águas que jorravam da rocha água pura e limpa para o consumo humano e que serviu como matéria prima para a preparação da argamassa para a construção das primeiras edificações da nova cidade/sede do Governo-Geral do Brasil “Salvador” fundada em 29 de março de 1549 e nomeando Tomé de Souza o primeiro governador-geral do Brasil.

 

Para o correto manuseio e aproveitamento das águas dessas nascentes, as primeiras fontes de água potável da cidade de Salvador foram construídas em alvenaria. São elas:

1.   Fonte da Pedreira ou da Preguiça;

2.   Fonte do Pereira ou da Montanha;

3.   Fonte dos Padres ou do Taboão.

 Todas elas localizadas na parte da falésia e bem próximas ao mar da Baía de Todos os Santos.


Fonte da Pedreira ou da Preguiça


Localizada na Ladeira da Preguiça. Em 1587, Gabriel Soares de Sousa, relata sobre a importância desta fonte para o abastecimento da água para os moradores da Preguiça e Ribeira do Góes além também para o abastecimento das naus. Foi construído em 1851 um frontão triangular no estilo neoclássico que é possível visualizar até os dias atuais.   

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A água ainda jorra das bicas que ainda hoje são utilizadas pelos banhistas da praia da preguiça e pelos moradores em situação de rua da região do comércio ou cidade baixa em Salvador.


Fonte dos Padres ou do Taboão


É uma das mais antigas fontes da cidade. Localizada na rua Conde D'Eu, em um arco, sob a ladeira do Taboão, Comércio (cidade baixa). Garantia, primitivamente, suprimento de água ao Colégio dos Jesuítas. Mas, devido a sua distância, já em 1590, os Jesuítas tinham cavado no Colégio um poço de 20 metros de profundidade para achar um pouco de água que abastecesse as oficinas.  Originalmente a água jorrava da boca de uma máscara esculpida em pedra, localizada ao fundo do nicho, atualmente desaparecida. Nos dias atuais a fonte dos Padres encontra-se em recuperação e requalificação em parceira feita pela Prefeitura de Salvador e a UNESCO.     

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Fonte do Pereira ou da Montanha

Localizada no sopé da ladeira da Montanha a Fonte do Pereira possui esse nome por fazer parte do terreno doado ao soldado degredado “Pereira” que veio na armada do Tomé de Sousa.  Uma curiosidade: O soldado Pereira fora pioneiro na comercialização de água aos navegantes e aos habitantes da cidade. A Fonte tornou-se, além de abastecimento de água, um local de encontro dos mareantes devido sua aproximação ao mar. Infelizmente a fonte já não existe fisicamente e no local há uma placa indicativa da Fonte do Pereira na ladeira da Montanha Comércio (Cidade Baixa). A água ainda jorra ou chora pela encosta que tanto matou a sede de muita gente, hoje é,literalmente, jogada no bueiro. 

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Fonte do Queimado

Com a poluição dos rios e das fontes de água potável que abasteciam a cidade do Salvador, os jesuítas encontraram em 1801 mais uma nascente de água pura e que passou a ser chamada, em 1838, de “Fonte do Queimado”. A fonte, além de abastecer a cidade, teve uma grande importância para a cidade. É daí que surge, em 1852, a primeira companhia de abastecimento de água do país. Com o objetivo de solucionar o grave problema de abastecimento de água da cidade utilizando chafarizes instalados nas praças da cidade, o principal dele foi o chafariz localizado na Praça do Terreiro de Jesus e as casas de vendagens. Idealizado por Dr. João Maurício Wanderley o famoso “Barão de Cotegipe” o início do seu funcionalmente deu-se em 1857. O novo sistema foi algo tão inovador para a época que até a família Imperial D. Pedro II e a imperatriz Teresa Cristina e personalidades da época  vieram a Salvador em 1859, (conforme indica a placa abaixo), para conhecer esse importante sistema de comercialização e distribuição da água.

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Com o passar do tempo o sistema foi sendo modernizado. Em 1971, através da Lei Estadual número 2.929 foi criada a Empresa Baiana de Água e Saneamento S/A (Embasa) que assumiu a responsabilidade de cuidar da água e das fontes da cidade de Salvador. Infelizmente, hoje, as fontes já não têm mais as mesmas finalidades. Surgindo assim o Parque do Queimado e em 2014, o lugar foi cedido pela Empresa Baiana de Águas e Saneamento (Embasa), que passou por uma grande revitalização para receber o Instituto de Desenvolvimento Social pela Música (IDSM), responsável pela gestão do NEOJIBA (Núcleos Estaduais de Orquestras Juvenis e Infantis da Bahia). O Parque do Queimado reabriu suas portas à comunidade em 09 de julho de 2019 e oficializando a Sede do Programa NEOJIBA e um dos espaços para a prática e o ensino musical mais bem equipado do país.

Antiga sede da usina que bombeava água do complexo do Queimado para o centro da cidade do Salvador e que hoje e a sala principal de ensaio e apresentação do NEOJIBA - Núcleos Estaduais de Orquestras Juvenis e Infantis da Bahia.



Chafariz do Terreiro de Jesus

Um belo chafariz localizado no coração da cidade, no Largo Terreiro de Jesus, que jorrava água pura e de qualidade, foi inaugurado em 08 de dezembro de 1856 e começou a ser instalado possivelmente em 1855 integrando o sistema de águas do Queimado para abastecer a população do antigo Distrito da Sé. Com certeza esse chafariz e outros como também as antigas fontes de água foram locais de grandes encontros dos aguadeiros, em sua maioria escravizados que buscavam água para comercializar. Os detalhes que compõe o chafariz de ferro fundido e mármore de Carraca representam as riquezas e características da Bahia. As esculturas da base (duas de entidades femininas e duas masculinas) representam os quatro principais rios da Bahia: Jequitinhonha, Paraguaçu, Pardo e São Francisco. Essas esculturas são do artista francês Mathurin Moreau. No alto, uma magnífica escultura da Deusa Ceres ou a “Deusa da Abundância”.


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A história de Salvador tem uma forte ligação com as águas

Ocorre no mês de janeiro a tradicional lavagem das escadarias da igreja do Bonfim onde o povo recebe das baianas o banho de água de cheiro.

Já no mês de fevereiro as celebrações são nas águas doces e salgadas da Bahia. No Dique do Tororó a celebração é para saudar a Rainha das águas doces “Oxum” e, no mar do Rio Vermelho, a Rainha das águas salgadas Iemanjá.

Durante o mês do aniversário da fundação de Salvador a cidade recebe as fortes chuvas corriqueiras, as conhecidas “águas de março” deixando a população em estado de alerta, pois as chuvas trazem vários transtornos para os moradores. E com a mudança climática nos últimos anos e os aterramentos das nascentes dos rios, cada vez mais a cidade sofre com os alagamentos, os deslizamentos de terras e a poluição que desagua diretamente no mar. Outro fenômeno natural que acontece na cidade é a “maré de março” período do ano em que o volume de água aumenta na costa, que afasta os banhistas das praias para evitar o afogamento.   

Salvador, cadê suas nascentes, seus leitos, suas águas e suas fontes? O que queremos para o presente e o que iremos deixar para as futuras gerações?



Ficha Técnica Acervos Virtuais Baianos/FPC

Coordenação: Clíssio Santana
Montagem/Revisão:Raquel Pinto
Texto/Pesquisa/Fotos: Onizio Casemiro   

 

Referências:

AZEVEDO, T. Povoamento da cidade de Salvador. Salvador: Itapuã, 1969. 428p.

Bahia, Fundação Gregório de Matos. Catálogo de Estudo e Projetos de Restauração Elaboração pelo Estado. Salvador, 1985.

BOCCANERA JUNIOR, S. Bahia Histórica: Reminiscência do Passado, Registro do Presente. Salvador: Bahiana, 1921. 308p.

BOCHICCHIO, R. Salvador das mil fontes. A Tarde. Salvador, 03 ago. 2003. Caderno 02, p. 06 e 07.

SAMPAIO, Theodoro. Abastecimento de água da cidade da Bahia.

TOURINHO, Aucimaia de Oliveira. Estudo Histórico e Sócio-Ambiental das Principais Fontes Públicas de Salvador. 2008. 155 p. Dissertação de Msc, Escola Politécnica, Universidade Federal da Bahia. Salvador, 2008.

 

Fotos:

1. A Fonte Nossa Senhora da Graça, em 2008 (fotografia publicada no artigo As Fontes na Cidade de Salvador, de Aucimaia de Oliveira Tourinho e Nicholas C. de Almeida Costa, publicado na revista RIGS, em 2012.

2. Foto da Fonte da Pedreira ou da Preguiça,03.02.2022 - Onizio Casemiro.

3. Foto da Fonte do Pereira ou da Montanha,03.02.2022 - Onizio Casemiro.

4. Foto da Fonte dos Padres ou do Taboão, 1890.

5. Foto da Fonte dos Padres ou do Taboão,03.02.2022 - Onizio Casemiro.

6. Foto - Placa indicativa, da Fonte do Pereira, 03.02.2022 - Onizio Casemiro.

7/8/9. Foto do Fonte do Queimado,04.02.2022 - Onizio Casemiro.  

10.  Foto Chafariz Terreiro de Jesus, 30.01.2022 - Onizio Casemiro.



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